Deus é um Pai que nos educa

Deus é um Pai que nos educa

Ora, qual é o filho a quem seu pai não corrige” (Hb 12,7).

Deus é nosso Pai, mas não é paternalista, isto é, Ele nos corrige quando é necessário a fim de chegarmos à perfeição que deseja para nós. A Carta aos Hebreus explica isso muito bem:

“Filho meu, não desprezes a correção do Senhor. Não desanimes, quando repreendido por ele; pois o Senhor corrige a quem ama e castiga todo aquele que reconhece por seu filho” (Hb 12, 5-6).

“Estais sendo provados para a vossa correção: é Deus que vos trata como filhos (…) se permanecêsseis sem a correção que é comum a todos, seríeis bastardos e não filhos legítimos” (Hb 12,7-8).

Quer dizer, aos olhos da fé, as provações desta vida são usadas como parte da pedagogia paterna de Deus em relação a nós, Seus filhos. “Feliz o homem a quem ensinais, Senhor” (Sl 93,12). “Bem-aventurado o homem a quem Deus corrige!” (Jó 5,17).

E o apóstolo foi profundo na questão:
“Deus nos educa para o aproveitamento, a fim de nos comunicar a Sua santidade” (Hb 12,10).

Pelas provações, Deus quer fazer-nos santos. É por isso que a provação é penosa para nós. Mas, disse o apóstolo:

“É verdade que toda correção parece, de momento, antes motivo de pesar que de alegria. Mais tarde, porém, granjeia aos que por ela se exercitaram o melhor fruto de justiça e de paz” (Hb 12,11).

A partir desta lição, o apóstolo preferia gloriar-se das suas fraquezas, e não dos seus sucessos:

“Portanto, prefiro gloriar-me das minhas fraquezas, para que habite em mim a força de Cristo (…) porque quando me sinto fraco, então é que sou forte” (2Cor 12, 7-10).

Portanto, não nos assustemos com o sofrimento de cada dia: ele é a cruz da nossa salvação. É por isso que Jesus nos disse: “Tome cada dia a sua cruz, e siga-me” (Lc 9,23c).

Para o santo Cura D’Ars, São João Vianney, para ganhar o Céu é preciso da graça e da cruz. Ele dizia que “o sofrimento é necessário para conservar a graça”.

A hora das grandes almas é a hora do sofrimento; se agigantam. Como dizia Lacordaire: “Quando tudo está perdido, então é a hora das grandes almas”.

É uma arte saber aproveitar as nossas misérias para nosso progresso espiritual, assim como se aproveita o esterco para adubar a planta. A cruz que Deus permite chegar a nós vem coberta de graças.

Sem dúvida, o sofrimento é um purgatório antecipado na terra, onde já vamos nos purificando e santificando. É o jardineiro divino que poda a videira para que dê mais frutos (Jo 15,5).

Somos como o barro nas mãos do oleiro. Deus torneia, endurece, põe no fogo, quebra-o quando necessário. Nunca o vaso diz ao oleiro “não estou contente!” ou “por que me fizeste assim?”

Um dia Michelangelo mostrou para seus discípulos uma pedra de mármore e disse-lhes: “aí dentro há um anjo, vou colocá-lo para fora”. E começaram a trabalhar a pedra. Logo o anjo foi surgindo nas mãos geniais do artista. Seus alunos admirados lhe perguntaram: “Mestre, como foi possível isto?” Ele lhes respondeu: “o anjo já estava dentro da pedra, nós apenas o colocamos para fora tirando o que estava sobrando (…)”.

Deus faz assim conosco, “vai tirando os excessos que estão sobrando” e impedindo o anjo de surgir em nossa alma. As marteladas e os cortes do Artista divino vão moldando-nos novamente a sua imagem e semelhança, como fomos criados. Isto pode doer, mas vale a pena.

São Bernardo dizia que “o mundo vê a cruz mas não vê a unção”. Elizabeth da Trindade se oferecia a Jesus como uma “humanidade de acréscimo, na qual possa Ele ainda sofrer para a glória do Pai e as necessidades de sua Igreja e perpetuar no mundo sua vida de reparação, de sacrifícios, de louvor e de adoração” (Elizabeth da Trindade, XII, XIII). Santa Gema Galgani dizia: “Queres amar? Aprende primeiro a sofrer”.

Nos acontecimentos da vida muitas vezes não entendemos o que nos sucede. Na verdade é a mão de Deus a nos conduzir, às vezes no meio do silêncio e da dor. Só entenderemos depois (…).

O médico não prescreve o medicamento que agrada ao paciente, mas aquele que o cura.

É também pelas numerosas e preciosas cruzinhas de cada dia que o Artista Divino vai moldando a nossa alma, à sua própria Imagem. Aquela dor de cabeça, aquela palavra dura que você recebeu injustamente, a doença do filho, a falta do dinheiro, o acidente do carro (…).

A nós cabe ter paciência e aceitar cada golpe, cada revés, cada humilhação, cada doença, enfim, cada corte do Artista, com resignação e ação de graças. O anjo de nossa alma está surgindo na frente do Artista.

Certa vez, andando no cemitério, por entre as sepulturas, em dado momento deparei-me com essa frase em uma delas: “A melhor oração é o sofrimento”.

É verdade, pensei, mas desde que seja abraçado na fé e na paciência, e oferecido ao Pai junto com o sangue de Jesus, num ato de amor e de oblação.

São Paulo falava da “loucura da cruz para aqueles que se perdem, mas poder de Deus para aqueles que se salvam” (1Cor 1,18).

Jesus ensinou à confidente do seu Coração, Soror Benigna Consolata, como se deve sofrer:

“Quando sofres, quer interna quer externamente, não percas o merecimento da dor. Sofre unicamente por Mim”.

A maior vitória sobre o sofrimento inevitável, qualquer que ele seja, será sempre o nosso silêncio e aceitação, oferecendo-o a Deus. Os santos ensinam que as melhores penitências são aquelas que Deus, o Médico das almas, permite que cheguem a nós; não as que nós escolhemos. De que adianta a penitência que nos impomos, se não aceitamos aquelas que Deus nos impõe, na medida exata da nossa correção?

De nada valeria o sacrifício de um enfermo que quisesse tomar muitos remédios amargos que não fosse aquele receitado pelo médico.

Não estou aqui desprezando as mortificações que nos impomos, contudo, mais importante do que elas são as que a divina Providência permite chegar a nós.

Quantos homens e mulheres neste mundo só encontraram Deus e uma vida equilibrada depois de uma doença, de uma perda grande, de uma falência! Foram muitos: São Francisco de Assis, São Paulo, Santo Inácio de Loyola (…), e talvez você mesmo!

O poder invisível de Deus se manifesta no sofrimento. Cura a alma, salva o espírito, quebranta o orgulho, elimina a vaidade, abate a opulência, iguala os homens (…).

É no sofrimento que os homens se sentem mais irmãos, filhos do mesmo Pai. É na hora amarga da dor que se valorizam a fraternidade e a solidariedade. Veja, por exemplo, os momentos de tragédias, terremotos, etc. É nessa hora sagrada que os corações se unem, as mãos se apertam e o filho lembra-se do Pai.

Não fosse o sofrimento angustiante daquele filho pródigo do Evangelho, jamais ele teria abandonado a vida devassa e voltado para a boa casa do Pai. Sim, o sofrimento é sagrado!

É nele que encontramos a nós mesmos e encontramos os outros, sem máscaras, sem enfeites e sem enganos. Ele não foi criado por Deus, mas Cristo lhe deu um enorme sentido.

“Aquele que não conhecera o pecado, Deus o fez pecado por nós a fim de que nos tornássemos justiça de Deus por Ele” (2Cor 5,21).

Então agora, todo sofrimento é redentor, tem um sentido. Agora, nenhum sofrimento e nenhuma lágrima são perdidos depois que Cristo sofreu. Por isso a Igreja reza: “Com a Sua morte destruiu a morte, e com a Sua ressurreição devolveu-nos a vida” (missa do Tempo Pascal).

Aqueles que participam dos sofrimentos de Cristo, são também chamados, mediante os seus próprios sofrimentos, a tomar parte na sua glória. “Eis uma verdade absolutamente certa: Se morrermos com ele, com ele viveremos. Se soubermos perseverar, com ele reinaremos” (2Tm 2, 11-12).

Na medida em que tomamos e assumimos a nossa cruz, unindo-nos espiritualmente à cruz de Cristo, vamos sentindo o valor salvífico do sofrimento; e esta descoberta é acompanhada de paz interior e alegria espiritual. Isto levava o apóstolo a dizer: “Alegro-me nos sofrimentos suportados por vossa causa” (Cl 1,24).

Fonte: Cléofas